O tempo esgotou

by - sexta-feira, julho 04, 2014


Você me manda mensagem e diz que já está ali embaixo há meia hora. Eu dou um pulo, pego minhas coisas e rolo os olhos enquanto escrevo: por que você não me avisou? Deixo o escritório às pressas. Você já está ali embaixo. Eu levo alguns segundos para te encontrar, e você me avisou que seria assim. Está me esperando do lado de fora do carro. Eu sorrio. É sempre assim. Quando entro, levo um susto. Você fez o que eu sempre lia em livros - baixou a discografia de uma das minhas bandas preferidas e colocou para escutarmos. Tento não morrer por dentro. 



A gente vai ver um filme. Você compra pipoca e pão de queijo, e eu sinto que, pela primeira vez na vida, estou fazendo algo certo, porque estou comendo pipoca na frente de um menino e não estou morrendo por dentro ao fazê-lo. E você me segura com tanta força, como se eu fosse a coisa mais real que já tivesse acontecido. E eu sinto isso bater entre as costelas e reverberar pelo coração, porque você também é a coisa mais real que já aconteceu.

E aí vamos patinar no gelo. E isso já não parece a minha vida, onde os garotos que conheço pela noite são sempre somente noite, noite e noite. E onde sempre vão, vem, vão, vem, vão (?). A gente colidiu na noite, mas você jurou que não era um garoto de noite, jurou que passou o dia se girando na cadeira, decidindo se ia ou não ia a uma cervejada onde sempre a mesma coisa acontecia. A sua cervejada era o meu James. E quando me dei conta de que talvez estivesse dentro de um livro da Meg Cabot, você bateu o seu capacete no meu e aquilo fez um eco na minha mente: tum, tum, tum. Acordei. Aquilo era mesmo a minha vida. 

Entramos na pista. Eu havia, por três segundos, me esquecido como era patinar. E a sensação era tão esmagadora que eu não consegui parar de sorrir. Você estava agarrado à borda, falando que eu iria rir muito porque você iria cair. Eu peguei a sua mão. perguntou: quer mesmo ir de mãos dadas? E se eu te derrubar? Dei de ombros e parafraseei The Maine em minha mente: if we are falling, at least it's together. Patinamos por um tempo, girando e girando, e você sabe que não houve um minuto dentro daquela meia hora em que eu não sorri. Charlie Brown começou a tocar; vacilei, me desequilibrei e você também. O mundo virou gelo, e o barulho que fizemos ao cair foi o som que a nossa colisão causou no mundo. Foi gelo pra todo o lado. Nós rimos e você se levantou rápido pra me levantar e eu pensei: ele não está se levantando rápido pela vergonha de cair, está se levantando rápido para ter certeza de que eu vou me levantar também. 

Rimos mais. E teve tantas horas que quase caímos mas não caímos, e eu não parei de rir por um minuto, e uma hora a gente rodopiou, tipo um segurando o outro, e aí não caímos, mas tinha um garoto do lado de fora me olhando, e eu juro por Deus que ele era o passado, me testando mais uma vez, e ele olhou pra mim e sorriu, do tipo: Isso foi, você sabe, a coisa mais incrível. Como se ele quisesse ter o que eu estava tendo bem ali, como se quisesse ser o carinha de uma cervejada que colide com a criadora de histórias, como se ele quisesse ter todo aquele punhado de magia que é o metal raspando no gelo e o que duas pessoas andando de mãos dadas em cima desse gelo poderia significar, como se ele quisesse ser a pessoa que fica rindo e caindo mas ao mesmo tempo não caindo jamais.

O tempo esgotou, o carinha do microfone grita, e já é hora de sair do gelo, mas eu não me importo ou fico triste como a criança ao lado que chora porque sabe que a diversão do dia acabou, e que os pais não deixarão voltar tão cedo. Eu fico feliz como a criança que está lá do outro lado, pronta para entrar na pista de patinação pela primeira vez. 

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2 comentários

  1. Oi, Monique! Como vai?
    Gente, que texto lindo <3 Achei um amor e a sua escrita prende. Muito bom!!! Pensei que seria um fim triste por causa do passado e por causa do título. Simplesmente não esperava e AMEI! Gente... que amor. Poderia fazer um super comentário só falando o quanto tá amorzinho esse texto. Ó, tá um amorzinho *-* Ai meu coração. Muito, muito, muito maravilhoso.
    Beijinhos,
    Karol.
    http://heykarol.blogspot.com.br/

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  2. Esse texto tá incrível por milhões de motivos, mas sabe o mais importante? Me fez sorrir do começo ao fim :)

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