Tudo que começa mal termina em colisão

by - segunda-feira, junho 11, 2018

o brilho no asfalto molhado por causa da chuva era o mesmo brilho que você tinha nos olhos na nossa última noite juntos.

a gente brigava por um motivo que nem importava, você tinha um cigarro entre os lábios, foi embora deixando nada além de um rastro de fumaça - mas ia voltar, eu tinha certeza.

você voltou.

essa história não começa com uma colisão, mas certamente termina como uma.

seis meses antes: estamos na pont neuf e você ri dos meus brincos e me chama de frogy, uma disputa idiota, frança x inglaterra, e se você ao menos soubesse o significado real disso… ele era inglês… você me fala sobre essa ponte em paris: “a melhor vista para a torre eiffel, te juro”, eu rio, você ri, é quase como se estivéssemos bebendo a noite, o céu, as estrelas, mas é só vinho mesmo. ali, bem ali, eu já podia ver o começo de algo que escaparia pelos meus dedos como grãos de areia de uma ampulheta. tique-taque, tique-taque, tique-taque.

de qualquer forma, eu sabia que teria que ver essa ponte com os meus próprios olhos, mas obviamente esqueci o nome dela no dia seguinte, assim como esqueci tantas tantas tantas tantas tantas tantas outras coisas que você me disse naquela e em todas as noites seguintes, para a minha agonia.

foi só em dezembro que você me enviou o nome da ponte, quando tudo estava desmoronando, quando eu estava desmoronando. choveu tanto e tanto e tanto no dia em que eu visitei a Pont Alexandre III que eu realmente pensei que estava tudo acabado, eu estava acabada, e a chuva levava embora os últimos pedaços de você.

eu costumava usar essa frase como escudo: tudo que começa mal, irremediavelmente acaba mal. mas olha só pra gente: separados por continentes e, ainda sim, o mundo decidiu que deveríamos colidir mais um pouco. e de colisões, eu entendo.  

mas seis meses depois o mundo tinha decidido que bastava, agora era a hora de te deixar ir. eu, a batida das asas da borboleta, você, o tsunami na ásia. mas fui sortuda, ok, não só sortuda mas também perspicaz o suficiente, como um ladrão que se esgueira na calada da noite, para conseguir te dar adeus não uma, mas quatro vezes (e ainda contando). na verdade, eu vinha te dando adeus desde que descobri que você partiria. eu disse adeus incontáveis vezes pra alguém que só foi embora uma vez. loucura? tomara que seja.

eu tive que voltar à ponte pra te dizer adeus. em paris. e é tão louco e não faz o menor sentido porque nunca nem estivemos em paris juntos. e eu deveria estar chorando (já chorei). deveria estar zangada com o universo (já fiquei), por que como alguém aparece na sua vida desse jeito e depois é despachado pra outro continente? deveria estar passando na frente do seu apartamento e pensando ele não mora mais aqui, ele nunca mais vai morar aqui. deveria, obviamente, tentar lembrar de cada centímetro de você, aquela cicatriz perto do pulso, aquela outra mais nova na sua mão esquerda por causa do joselito, o jeito que seus olhos se fecham quando você dá uma gargalhada, aquela que vem do fundo da alma e desabrocha na garganta, a maneira como seu cabelo fica bagunçado de manhã, deveria, também, estar colocando o CD do eddie vedder no repeat, bebendo vinho para matar a sede (foi você quem me ensinou) e por que não também alimentar patos no daurade, mas em vez disso só consigo pensar que você não entrou na minha vida como uma colisão, mas acabou se tornando uma. e isso me faz sorrir. não foi um erro, nem casualidade, foi doloroso, efêmero, impiedoso, mas também real, mágico e louco. e se eu to aqui, nessa ponte, nove meses depois, sorrindo, é porque eu carpi a porra do diem, porque respirei mastiguei engoli e digeri todos os minutos, segundos, milésimos e não me arrependo de nada, nada, rien, rien.    

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